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                   DEMISSÕES  DE FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS 
                  16.06.1990 
                     
                     
                    Estava em Curitiba, capital do Paraná, em uma recepção no Palácio Iguaçu,  quando o telefone soou. Era um dos diretores do CNPQ cobrando uma lista de  demissíveis.  
                    Fiquei lívido diante da cruel realidade.  
                    Durante dias e dias convivi com a ameaça, em meio de gente tensa, confiante na  minha liderança, na esperança de que a onda de demissões não chegasse ao IBICT,  Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, em Brasília, onde  eu era o Diretor.  
                  No vai—vem  da Reforma administrativa do governo federal, com o fechamento de ministérios e  órgãos da administração, havia recebido equipamentos e até novos funcionários!  Mas o telefonema era claro: eu tinha até 18 horas daquele mesmo dia para enviar  a lista.  
                    Aleguei que eu estava a 1.500 km de distância de Brasília e que o vice-diretor  estava mais longe ainda. Então — disseram — que eu determinasse ao meu  substituto para fazer a lista.  Não  transmitiu critérios nem limites.  
                    Os jornais anunciavam a extensão das medidas: o Secretário de Administração —  Santana—, queria cortar 30% do funcionalismo, 360.000 pessoas deveriam ser  demitidos ou tomar o destino do “banco de reserva”, com salários reduzidos.  
                   
                    Telefonei para a Assessoria de Planejamento, no exercício da Direção. Ela  recebeu com calma, com resignação. Reuniu os chefes de divisão, fora do prazo —  no dia seguinte, e emergiu uma lista de 14 nomes, e não 60 como solicitaram. 
                    Havíamos feito análises probabilísticas sobre o impacto de 10, 20 ou 30% de  cortes na estrutura do Instituto, e nos programas e serviços. Havia pouca  “gordura” para queimar se o órgão tivesse que ser prestigiado e apoiado, para  cumprir a sua missão. O quadro era aquém da necessidade. De qualquer forma, os quatorze  apontados para a quota do “sacrifício” indispensável, não afetariam  consideravelmente a produtividade no futuro. Garantiram-me que eram pessoas já afastadas  voluntariamente, sem vencimentos (3 deles), um aposentado em outro órgão  público ou na época de ser aposentado, e os restantes eram faltosos e pouco  eficientes.  
                   
                    A TV anunciou que o Diário Oficial saiu em edição extra, em pleno sábado, com  10.700 nomes. Eram os primeiros. Outras listas viriam.  
                    Mas a TV continuou falando da Copa do Mundo de Futebol, da vitória do Brasil  sobre a Costa Rica. O povo dançando lambadas nas ruas.  
                    Segunda-feira, quando recomeçaram os trabalhos, o clima era de terror. Não  obstante as causas saneadoras dos cortes, dado o seu volume, eles vão instaurar  um período de enormes dificuldades para muita gente. Havia lugar para erros e  injustiças, pois a dimensão da sangria é imensa.  
                    É pouco provável que o Governo atinja a meta dos 360.000. É praticamente  impossível. Há quem diga que não atingirão os 100.000 mas, independentemente da  quantidade, Brasília vai ficar irrespirável. Não há como absorver tantos  desempregados. O problema social vai ser incomensurável. Muitos serão  vítimas  de um processo maligno. 
                   
                    Todo mundo reconhece que o Estado está “inchado”, que não há dinheiro para  pagar a folha de pagamento, que o déficit público causa inflação e impede  investimentos produtivos, socialmente mais justos! 
                    Mas os cortes trarão a desgraça para muitos, o “enxugamento” não será feito de  forma correta e justa... Sobreviverão muitos protegidos e muitos inocentes  fatalmente irão para a rua...  
                
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